Foram catalogados como investidores beneméritos em 2015, quando entraram na TAP, uma companhia aérea já então em crise.
Em plena pandemia, que ainda mais afundou a companhia aérea portuguesa, David Neeleman e Humberto Pedrosa saíram da TAP numa rocambolesca negociação com o ex-ministro Pedro Nuno Santos, mas com todos os dedos e mais uns quantos anéis. Cálculos do PÁGINA UM apontam que, no conjunto, pela passagem pela TAP amealharam quase 60 milhões de euros. A parte de “leão” coube ao empresário norte-americano, que terá “levado para casa” 52 milhões de euros. Já o empresário português, dono do Grupo Barraqueiro, terá lucrado os restantes oito milhões de euros. Este é o segundo artigo de um dossier que o PÁGINA UM está a publicar sobre a TAP. Muitas perguntas estão por responder em torno das operações e contas da companhia aérea. A comissão parlamentar de inquérito à gestão política da tutela da TAP deverá trazer mais luz sobre as dúvidas que subsistem. A tomada de posse foi ontem.
Era uma época de taxas de juro negativas. E ninguém diria mas foi com um investimento numa empresa em dificuldades que David Neeleman e Humberto Pedrosa terão conseguido encaixar milhões em lucro. No total, a entrada – e posterior saída – da TAP, rendeu quase 60 milhões de euros em lucros.
O empresário norte-americano, fundador da brasileira Breeze Airways, terá levado a maior fatia: cerca de 52 milhões de euros. Quanto ao empresário português, dono do Grupo Barraqueiro, terá lucrado uma verba a rondar os oito milhões de euros.
O PÁGINA UM passou a pente fino os relatórios e contas da TAP dos últimos exercícios e também escrutinou as operações executadas em torno da privatização da companhia em 2015, reversão da venda e posterior saída dos investidores privados do capital da empresa. No primeiro artigo deste dossier, o PÁGINA UM noticiou que a companhia aérea custou 3.200 milhões de euros ao erário público desde a privatização, em 2015.
Isto numa empresa que, nos dois últimos exercícios registou prejuízos de 2.800 milhões de euros e, desde a privatização, em 2015, só registou lucros em 2017, de 23 milhões de euros.
O jornal Correio da Manhã já havia noticiado, no dia 11 de Fevereiro, que Neeleman encaixou um lucro de 52 milhões de euros com o seu investimento na TAP. Aliás, o financiamento da entrada do norte-americano na TAP está envolto em polémica, com notícias a apontar que terá pago tudo com “o pelo do próprio cão”, através de uma operação que envolveu a Airbus e a negociação da troca da frota da companhia. Segundo o Eco, o norte-americano assumiu o controlo da TAP com dinheiro da própria empresa.
A venda de 61% do capital da TAP, em 2015, ao consórcio detido em partes iguais pelos dois empresários – Atlantic Gateway – foi executada pelo Governo PSD/CDS liderado por Pedro Passos Coelho. Mas, apenas três meses após a privatização, a venda foi revertida, por decisão do Governo do PS, liderado por António Costa.
As contas são fáceis de fazer. David Neeleman pagou cinco milhões de euros por metade de 61% do capital da TAP, aquando da privatização em 2015.
O investidor recebeu depois 45 milhões de Humberto Pedrosa pela participação de 50% na Atlantic Gateway e mais 55 milhões pela venda de 22,5% da TAP ao Estado português.
Além destas verbas, pelo meio, encaixou 389 mil euros pela venda de 37,5 milhares de acções aos trabalhadores da TAP, a 10,38 euros cada e 950 mil euros pela venda de 82,5 mil acções ao Estado, a 11,52 euros cada, quando este desejou recuperar o controlo da empresa.
Neeleman pagou 112 milhões de euros – metade dos 224 milhões de euros – pelas Prestações Suplementares pelo acordo que tinha com o Estado português. Recebeu ainda 67,5 milhões de euros pelos juros a 7,5% durante 10 anos sobre o empréstimo obrigacionista da Azul de 90 milhões de euros.
No caso de Humberto Pedrosa, os cálculos do PÁGINA UM com base em documentos oficiais públicos disponíveis apontam que terá obtido um lucro de oito milhões de euros.
Para esta fatia milionária do “bolo” de lucros que caíram no colo dos accionistas privados da TAP, contabilizam-se a verba de 169 milhões de euros pela venda, por parte de Pedrosa, das Prestações Suplementares à Parpública. Por outro lado, o empresário português pagou cinco milhões de euros por metade de 61% do capital da TAP aquando da privatização em 2015.
Pagou, depois, 45 milhões de euros a David Neeleman pela participação de 50% deste na Atlantic Gateway, quando o norte-americano saiu da companhia.
Pedrosa recebeu 389 mil euros pela venda de 37,5 milhares de acções aos trabalhadores da TAP, a 10,38 euros cada e ainda 950 mil euros pela venda de 82,5 mil acções ao Estado, a 11,52 euros cada, quando este desejou recuperar o controlo da empresa. O empresário pagou 112 milhões de euros – metade dos 224 milhões de euros – pelas Prestações Suplementares pelo acordo que tinha com o Estado português.
Em suma, contas feitas, estas complexas operações financeiras deram um lucro a Humberto Pedrosa de oito milhões de euros, que chegou a ser catalogado pelo ex-ministro Pedro Nuno Santos como “um empresário patriota“.
Não foi ainda possível obter comentário sobre estes dados por parte dos dois empresários.
Todas as dúvidas e contornos dúbios em torno dos acontecimentos dos últimos anos na TAP vão ser alvo de investigação na comissão parlamentar de inquérito à companhia.
A tomada de posse da comissão ocorreu ontem. Vão ser ouvidos os principais protagonistas dos eventos que levaram à actual situação da TAP.
Entretanto, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) abriu um inquérito à indemnização de 500 mil euros paga pela TAP a Alexandra Reis, que saiu da administração da companhia para a seguir ir liderar a NAV e acabar por ser nomeada para a pasta de secretária de Estado do Tesouro, no Ministério conduzido por Medina Ferreira. Mas Alexandra Reis acabou por sair do cargo com o estalar da polémica da indemnização.
O DCIAP também abriu uma investigação ao negócio envolvendo a troca de frota por aviões da Airbus, um negócio que teve a “mão” de Neeleman, noticiou o Observador. Neste último caso, a participação foi feita pelos Ministérios das Finanças e Infraestruturas.
O anterior ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, já tinha denunciado, em Outubro de 2022, no Parlamento, que existiam suspeitas em torno do negócio da frota e que o seu Ministério tinha enviado o caso para o Ministério Público, o que deu origem à abertura de um inquérito.
Certo é que, na nova comissão parlamentar de inquérito, presidida pelo socialista Jorge Seguro Sanches – que foi secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional até Fevereiro do ano passado –, matéria para investigar não vai faltar.
- Com a devida vénia ao Página Um e a Elizabete Tavares