BALBÚRDIA NO MINISTÉRIO DAS INFRA-ESTRUTURAS
Nos quase cinquenta anos de democracia e não considerando os “loucos” anos do PREC (“processo revolucionário em curso”) em 1974/75, nunca assisti a acontecimentos tão degradantes para as nossas instituições democráticas como aqueles que nos tem proporcionado o deprimente espectáculo decorrente da transmissão em directo dos trabalhos da “Comissão Parlamentar de Inquérito à Gestão da TAP”.
Vou deixar de lado a inacreditável balbúrdia observada na interacção entre o Adjunto exonerado com vários membros do Gabinete de João Galamba e os agentes de segurança que se deslocaram ao local.
Foram acontecimentos muito graves, que podem ir do roubo ao sequestro e até a agressões físicas. Neste âmbito estão já em curso investigação a cargo das autoridades policiais competentes. Mas é óbvio que o Ministro João Galamba – único responsável pela nomeação dos membros do seu gabinete, escolhidos por ele livremente e, portanto, elementos da sua estrita confiança -, teria a estrita obrigação de assumir a responsabilidade política pelos lamentáveis acontecimentos referidos.
Mas vou concentrar-me no que me parece essencial, abordando duas situações que considero especialmente relevantes.
Desde logo a evidência de que o Ministro faltou à verdade na Comissão a propósito de várias situações, para além de se ter “esquecido” numa primeira oportunidade de revelar contactos essenciais ao esclarecimento das situações, como sucedeu a propósito do contacto então mantido com o Ministro da Administração Interna.
Mas o ainda mais grave será toda a rocambolesca actuação do SIS (Serviço de Informações de Segurança) para recuperar o computador do ex-Adjunto, cuja legalidade foi sustentada no facto de considerarem não estar em causa um furto ou roubo. Se assim fosse, ou seja, perante um furto ou roubo, o SIS não poderia ter actuado mas sim a Polícia Judiciária. Só que, quer o Primeiro-Ministro, quer o próprio Ministro das Infra-estruturas, insistem em classificar o sucedido como roubo.
Em verdade, para a generalidade dos juristas que se pronunciaram sobre a questão ficou evidenciado que o SIS actuou ilegalmente. De resto, até hoje não foi esclarecido ao abrigo de que disposição legal o SIS se permitiu contactar o ex-Adjunto para recuperar o computador.
Neste contexto, estiveram bem o Presidente do PSD a exigir a demissão da Secretária-Geral do SIRP e os Partidos que requereram a presença na Comissão do Primeiro-Ministro e dos responsáveis pelo SIS.
Quando o Presidente da República recomendou ao Primeiro-Ministro a substituição de João Galamba e apesar do pedido de demissão deste, António Costa resolveu recusar e assim entrar em confronto aberto com Marcelo Rebelo de Sousa. Perdeu assim uma oportunidade de ouro para refrescar o Governo e ganhar um novo élan, como era recomendado pelo Presidente do PS e por vários outros cotados dirigentes socialistas, substituindo não apenas o Ministro das Infra-estruturas mas também vários outros titulares governamentais manifestamente inferiorizados, como serão os casos evidentes dos Negócios Estrangeiros e da Agricultura, entre outros.
Neste contexto de quebra da solidariedade institucional entre Marcelo e Costa e considerando que temos um Governo manifestamente desacreditado e sem rumo, suspeito que esta legislatura, contra o que seria desejável num quadro de normalidade democrática, não vai chegar ao fim.
- António d’Orey Capucho, Colunista do Jornal de Oleiros
Maio de 2023
Excelente texto!!
Só poderia concordar!
Obrigado por nos ler.