MISSIONÁRIOS DO CONCELHO DE OLEIROS PROVENIENTES DO COLÉGIO DAS MISSÕES, DURANTE OS PRIMEIROS 50 ANOS (1855-1905)
Este artigo faz uma modesta homenagem ao juiz João Ramos, meu professor do ensino preparatório no distante ano lectivo de 1977-78. Pois foi ele que, a seu modo, me iniciou nos mistérios da História e que, sobretudo no último ano de vida, instando comigo, me obrigou ao contrato tácito de escrever alguns artigos para o jornal de Oleiros, dos quais este é o primeiro.
Na longa agonia das Ordens militares e religiosas em Portugal, imediatamente antes de serem integradas na Casa do Infantado (1789) ou, depois desse acontecimento, antes da sua extinção (1834), várias novidades traçam novos caminhos das suas biografias seculares. Uma das mais inusitadas, no que concerne à Ordem de S. João do Hospital de Jerusalém (ou simplesmente Ordem de Malta) diz respeito à criação do seminário de São João Baptista do Priorado do Crato, na Quinta do Bom Jardim, em Cernache, por decreto de 10 de Março de 1791. Era então Grão-Mestre da Ordem o príncipe regente D. João (futuro D. João VI) e o local escolhido carregava consigo, ao mesmo tempo, venturas de glória guerreira e cheiros de santidade.
Em primeiro lugar, a Quinta do Bom Jardim compunha-se de uma casa senhorial acastelada com seus logradouros ajardinados, terras de cultivo e mais pertences, e fora uma das muitas e imponentes obras gizadas e construídas pelo carácter empreendedor de D. Álvaro Gonçalves Pereira, 1.º Grão-Prior do Crato. Em segundo lugar, de acordo com a maior parte dos biógrafos, foi nesse lugar que D. Iria do Carvalhal deu à luz o futuro Condestável do Reino, figura decisiva na crise dinástica de 1383-85: D. Nuno Álvares Pereira. Ora, a escolha daquele sítio para instalar o seminário prendia-se com um pedido (e talvez um voto pessoal) do Vigário Geral do Grão Priorado do Crato, D. Manoel Joaquim da Silva, Bispo de Adrianapolis, natural de Cernache, e tinha em mira fornecer os futuros freires àquela milícia sagrada.
Mas seria despropositado invocar esta breve resenha se, neste mesmo lugar, no dia 8 de Dezembro de 1855 não abrisse as portas (àqueles que sentiam o apelo divino) o Colégio das Missões. De facto, a fundação do colégio tinha em vista subsidiar, tanto quanto possível, a grande “cruzada” nacional religiosa do século XIX — a missionação do território ultramarino português. Por outro lado, aquela instituição está tão ligada à história do concelho de Oleiros, que seria um fracasso tentarmos compreender a história da vila e do seu termo, no plano religioso, sem abordamos a acção do Colégio das Missões. Bastaria para isso lembrar que o Bispo de Angra do Heroísmo, natural da vila de Oleiros, foi aluno do colégio, nele foi sagrado e chegou a Superior do mesmo (de 1865 a 1872) e no qual fundara o jornal Annaes das Missões Portuguezas Ultramarinas. Também deixaria, em testamento, cinco acções do Banco de Portugal ao Colégio, todas de duzentos e cinquenta mil réis, com a condição de se lhe cantar uma missa de requiem no aniversário da sua morte.
Todavia, apesar de aquele lugar carregar glórias e venturas de outrora, este artigo pretende somente arrolar os missionários do concelho de Oleiros, que, durante os primeiros cinquenta anos de vida do colégio, o frequentaram e dele partiram para as colónias. As viagens e a missionação dos indígenas eram tão perigosas que delas se esperava tão só um dos dois resultados possíveis: a redenção dos pecados ou a morte. Embalados pela esperança da salvação, os nomes que se seguem não merecem perder-se no esquecimento. Para eles vai a minha homenagem mais sincera e ao missionário Cândido Teixeira, grande estudioso do Colégio e das Antiguidades da Ordem de Malta nos aros de Cernache, Sertã, Oleiros, Álvaro e Proença a Nova, aqui deixo expresso o sentimento da minha gratidão. A maior parte das notas coligidas sobre os missionários provêm das suas aturadas pesquisas.
José Sérgio Antão Alvares, natural de Póvoa de Cambas, tendo concluído o curso e ordenação partiu em missão a 5 de Janeiro de 1872 para Macau. Foi nomeado professor do seminário diocesano. Regressou gravemente doente e morreu no Hospital de S. José em Lisboa.
Joaquim Luís Alvares, natural de Vilar Barroco, partiu em missão para S. Tomé no dia 5 de Outubro de 1878. Teve várias nomeações eclesiásticas e leccionou ensino primário na ilha do Príncipe. Serviu nas missões 23 anos. Mandou reconstruir a capela de Nossa Senhora do Rosário. Faleceu nesta ilha a 22 de Outubro de 1901.
António Luís, natural da freguesia de Oleiros, concluiu o curso e ordenou-se, partiu para Angola a 6 de Agosto de 1887. Foi pároco e professor da instrução primária da vila do Dondo. Construiu a igreja do Dondo, que foi benzida a 22 de Março de 1896. Foi nomeado cónego penitenciário da Sé de Luanda. Deixou as missões a 29 de Junho de 1896.
Joaquim Pinto de Albuquerque era natural e membro de uma das famílias mais gradas da vila, fez curso, ordenou-se e saiu para missão no ano de 1890 (chegou a Luanda a 30 de Junho). Foi missionar para S. Salvador do Congo, onde foi nomeado arcipreste e superior da Missão. Em 17 de Agosto de 1895 regressou doente à Europa; foi dado como incapaz de todo o serviço no ultramar.
António de Azevedo Bártolo, natural do Estreito, concluído o curso e feita a ordenação, embarcou em missão para Macau, onde chegou a 23 de Janeiro de 1894. Foi eleito Vigário Geral e Superior das missões na ilha de Timor. Em 1901 foi nomeado pároco da freguesia de S. Lourenço, em Macau. Em 1905 ainda era pároco na ilha de Taipa.
António Mendes Cardoso, natural da freguesia da Isna, concluiu o curso e ordenou-se, partiu para a missão de Moçambique onde chegou a 7 de Junho de 1895. Aí foi secretário da prelazia, pároco da freguesia da Sé e professor na Escola de Artes e Ofícios até 1900. Nesta altura acompanhou o Bispo da Diocese de Damão, D. Sebastião José Pereira e aí ficou.
João Esteves Ribeiro, natural da freguesia de Isna, acabado o curso e feita a ordenação, partiu para a Guiné a 22 de Setembro e chegou a 3 de Outubro de 1895. Foi logo nomeado pároco da Igreja de Nossa Senhora da Graça de Farim; igreja que era apenas um altar ambulante. Foi este padre que mandou construir a Igreja (de comum acordo com o Comandante da Praça, o tenente Jaime Augusto da Graça Falcão), de adobe (e caiada), e coberta a telha Marselha. De 1897 a 1899 paroquiou a Igreja de Nossa Senhora da Candelária de Bissau. Em Dezembro de 1899 regressou à Europa, depois de ter caído gravemente enfermo e tendo sido dado como incapaz para todo o serviço das missões ultramarinas.
Joaquim Domingues Coelho, natural do Estreito, acabado o curso e feita a ordenação, partiu para Angola onde chegou a 4 de Março de 1903. Foi logo nomeado capelão cantor da Sé Catedral, escrivão interino do Juízo Eclesiástico e amanuense da Câmara Eclesiástica. Porém, deixou estes cargos a 20 de Junho do mesmo ano por ter sido nomeado pároco da igreja de Nossa Senhora dos Remédios, na mesma cidade de Luanda. Pouco depois é nomeado capelão da Fortaleza de S. Miguel. Em 1905 ainda ocupava este cargo.
Uma palavra final, dirigida aos leitores deste artigo: aquilo que aqui se inventariou constitui apenas o início de uma investigação sobre o tema em epígrafe e que, a longo prazo, espero possa chegar a ser volume publicável em livro.
Leonel Azevedo
Nota do Director: Compreensívelmente, com orgulho, assinalamos o momento em que o Dr. Leonel Azevedo, insigne Historiador, se junta ao Jornal de Oleiros. Mais ainda por não esquecer o nosso Presidente do Conselho Editorial, Magistrado João Ramos, para quem todas as homenagens serão poucas e insuficientes sempre.
Em 20 de Outubro em Cambas, no jantar do nosso 3º Aniversário, não o esqueceremos.