LXXXVII – Crónica da Invasão da Ucrânia – Qual é a estratégia ocidental?

LXXXVII – Crónica da Invasão da Ucrânia

Jornal de Oleiros, Mendo Henriques

. Qual é a estratégia ocidental?

A proposta do sr. Jensen para a Ucrânia trocar territórios invadidos por segurança garantida veio lembrar a falta de definição estratégica da Europa quanto à sua própria segurança. Para a Europa do ocidente, do centro e do leste.

Os governos europeus e Washington sabem desde a primeira hora que joga-se nesta guerra o destino geopolítico do mundo e por isso responderam com determinação.

A administração Biden e os curadores da Europa perceberam o que estava em jogo; colocaram em ação apoios militares sucessivos e robustos para a Ucrânia; desbloquearam biliões de euros e dólares em ajuda económica;  são inequívocos em afirmar que só Kyiv pode decidir em que termos quer negociar a paz, recusando cenários inaceitáveis de negociações. E estes apoios que chegam em vários formatos continuam a ter o apoio maciço dos eleitores do mundo livre.

Contudo, há sempre vozes discordantes nos governos e a propaganda adversária sabe lançar dúvidas na opinião pública; o Washington Post de 26 de agosto acaba de anunciar o próximo plano do Kremlin para desestabilizar a opinião pública ocidental, como é feito todos os dias

Entretanto, o nevoeiro da guerra cansa as audiências. Seria maravilhoso se a Ucrânia vencesse com o nosso nível de apoio, dizem muitos; mas se não consegue, não podemos deixar que a violência cresça até aos extremos, que se prolongue demasiado no tempo, que chegue à beira da guerra nuclear; temos de ter outra solução. Para quê pagar biliões por mais um Km de avanço da Ucrânia, ou se o resultado final é mais 40 mil km2 a favor da Ucrânia ou a favor da Rússia?

Alguns grupos económicos alimentam a fantasia de que o mundo pode regressar ao 23 de fevereiro de 2022; se deixássemos passar o tempo, os investimentos e as trocas comerciais voltariam ao normal. Putin vai finalmente entender que errou, vai cair em si e agora é preciso dar-lhe uma saída. Nas sedes de multinacionais bilionárias e nalguns ministérios ocidentais, este argumento colhe votos.

Outros, ainda, dizem que faz sentido trazer a Ucrânia para a UE e a NATO, mas o melhor era nada disto ter acontecido, de não precisarmos dela na UE e na OTAN porque vai mexer nos arranjos de política externa e trazer- nos insegurança e problemas com o custo de vida.

Com estes argumentos, pretende-se induzir a Ucrânia a desistir da vitória completa, dando-lhe em troca dinheiro – por exemplo, os fundos russos congelados – e a oportunidade de pertencer à NATO e à EU; se desistirem dos territórios invadidos por Putin, obtêm esse dinheiro, segurança e pertença; senão, não.

Estes cenários pressupõem que a Ucrânia não alcança a vitória completa e que o Ocidente se satisfaz com uma Ucrânia segura mas desmembrada. São cenários assustadores, mas que devem ser encarados.

A Ucrânia obteve um estatuto de vítima inocente (René Girard) devido à agressão brutal que sofreu e tem-se defendido com fundamentos convincentes e que encontra eco em todos os livres. Ao mesmo tempo, é a projeção de poder dos EUA – e em grau menor, da Europa – que garante a segurança ucraniana. Para os impiedosos russos, está a travar uma guerra por procuração e, como diz a propaganda putinista, os EUA lutarão até ao último ucraniano.

A Ucrânia apenas consegue manter a atual contra ofensiva de Verão com apoios ocidentais sustentados. Em termos moralmente neutros, significa que está a travar uma guerra por procuração (proxy); não do poder imperial americano – como sugerem Putin e os seus sequazes da esquerda e da direita europeias – mas procuração apesar de tudo, porque povo, exército e governo sustentam-se com o financiamento e o armamento recebido dos Aliados.

É extraordinariamente difícil para a Ucrânia gerir um conflito existencial em que depende de outrem, neste caso, de governos patrocinadores, que, por sua vez dependem de eleitorados democráticos. É uma situação precária e assustadora não saber exatamente o que o Ocidente lhe oferece, nem que futuro pretende e há a ameaça de que um novo presidente dos EUA mude a decisão geopolítica e leve tudo ao fundo.

Essa ilusão tem de ser combatida encarando o regime de Putin, cada vez mais repressivo e sanguinolento. Verifica-se o princípio de Vladimir Kara-Murza; a repressão interna e a agressão externa reforçam-se mutuamente.

Putin reestruturou o regime; a propaganda e educação são cada vez mais militarista; há repressão e prisões dos oposicionistas; há assassinatos dos seus ex-apoiantes como se viu com Prigozhin e mais uns quantos oligarcas e generais; está a reestruturar parcialmente a economia na senda da guerra. Está a preparar as eleições de 2024 para criar um estado ainda mais autoritário, como afirmou o porta-voz Peskov

Um cessar-fogo é a oportunidade que Putin mais espera para se reconstituir enquanto considera que o Ocidente declina.

Os cenários de paz agitados nos corredores do poder ocidental não são bons nem funcionais.

Aceitar um cessar-fogo ou acordo de paz com Putin, é só desperdiçar tempo.

Após retomar forças, Putin recomeçaria a guerra contra um país ex-soviético, não necessariamente contra a Ucrânia, ou não apenas contra a Ucrânia.

Amanhã é outro dia!

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