Crónica da Invasão da Ucrânia, à distância . A terceira contra-ofensiva ucraniana

Crónica da Invasão da Ucrânia, à distância

. A terceira contra-ofensiva ucraniana

. 17 Junho 2023  – Mendo Henriques

A terceira contraofensiva ucraniana está em andamento e os estados-maiores da Ucrânia e da Rússia sabem que os ucranianos precisam cortar em dois os territórios invadidos e chegar até ao mar de Azov.

As forças ucranianas têm de aniquilar uma parcela dos adversários e forçar à fuga os que permanecem a oeste da linha de penetração e acelerar a retomada da Crimeia. A Rússia poderá dizer que abandona territórios como “gesto de boa vontade”  como o fizeram ao deixar a Ilha das Cobras no Mar Negro, alegando facilitar a exportação de cereais.

Ambos os adversários conhecem perfeitamente as possíveis linhas de penetração. O Kremlin teve oito meses para preparar várias linhas defensivas nas províncias de Kherson, Zaporozhye, Donetsk e Luhask com trincheiras, campos minados e pontos fortificados com artilharia, morteiros e drones; pôde também aproximar forças aéreas de apoio. No entanto, a ansiedade do estado-maior levou-o a permitir que as linhas de defesa do Dnieper fossem inundadas quando destruíram a barragem de Nova Kakhova. Mesmo assim, em 16 de junho os ucranianos retomaram tanques anfíbios nessa frente.

Do lado ucraniano, a contraofensiva, após lenta acumulação de equipamentos entregues por dezenas de nações amigas da liberdade – sobretudo EUA e Europa – tem de alfinetar cerca de 1200 quilómetros de frente, fazendo correr as reservas russas de um lado para o outro a fim de saber onde são mais fracas e, quando surgirem condições, iniciar uma penetração profunda.

Para dividir as forças russas, a linha ofensiva mais provável situa-se em Zaporozhye na direção de Orekhov a Tokmak (um grande entroncamento ferroviário fortificado, seguindo-se Melitopol – grande cidade – e depois o Mar de Azov.

Mar de Azov

A dura luta no saliente Vreminsky é um sinal deste esforço.

Mas na guerra, o mais provável nem sempre se concretiza como demonstrou Clausewitz e as grandes reservas ucranianas ainda não entraram na luta. Estamos falando de cerca de 35 mil militares com treino OTAN: 8 brigadas, 33 batalhões, dos quais – 6 TB, 16 MB, 3 GSHB, 2 SHB, 4 batalhões operacionais NSU, 1 MPB, 1 batalhão de defesa territorial. Aguardam que seja definido um ou mais corredores de penetração e podem esperar semanas.

Em equipamentos, terão cerca de 200 tanques, 800 veículos blindados de combate de todos os tipos, 450 sistemas de artilharia de campanha, morteiros e MLRS, 200 veículos antitanque, 200 sistemas de defesa aérea (incluindo MANPADS).

Apenas uma das nove brigadas preparadas para a ofensiva entrou em ação e mesmo assim com unidades do tipo companhia. A propaganda do Kremlin falou muito de 2 Leopardos e 3 Bradleys destruídos em um vídeo transmitido “1000 vezes” e mostrados de “100 pontos de vista diferentes” por propagandistas russos e repetidos pelos “perfeitos idiotas ocidentais”. São estes que espalham os rumores extraídos de segunda mão de redes pró-Kremlin. Muitos nunca tinham pensado na dura frase de Leon TrotskyPodes não estar interessado na guerra, mas a guerra está interessada em ti“. Entontecidos com ano e meio de guerra que nunca haviam estudado, permitem-se opiniões que exigem anos de formação em academias militares e que – ainda assim – apenas preparam oficiais para a guerra passada. Do lado russo, já rolaram muitos generais. Felizmente para os amigos da liberdade, ainda lhes restam muitos “generais de pacotilha”.

Esta terceira contra-ofensiva ucraniana não é uma réplica das anteriores. Não tem o mesmo ritmo, e enfrenta linhas de defesa muito mais preparadas. Na guerra, nada se repete e “os planos desmoronam ao primeiro contato com o inimigo” (Clausewitz, novamente). Sobre o que vai acontecer, a opinião é livre, mas a opinião válida requer um mínimo de informação, disponível em fontes públicas, além de fontes confidenciais

  1. a) Os blogueiros e notícias online russas que destacam as ansiedades da frente e conduzem as campanhas de desinformação de facções no Kremlin; o “partido da guerra” de Putin-Patrushev; o “partido da paz” de Putin-Shoigu; e Prighozin, que é um caso especial.
  2. As dificuldades de Putin em controlar as suas várias facções têm aumentado. Os números ilusórios de vítimas ucranianas vêm de blogueiros pró-Rússia como Dva Majora, Kotsnews, Grey Zone, Wargonzo e outros; há vozes dissonantes como as de Strelkov, SVR e Prighozin, novamente. A contrainformação russa está em declínio e nunca esquecer que a decisão para invadir a fevereiro de 2022 resultou de uma falha brutal de informação do FSB.
  3. b) As fontes ucranianas de facções pró e não governamentais. As fontes independentes realizam uma boa triagem de fontes russas. As fontes do governo exageram as baixas russas e silenciam as próprias baixas, o que é normal e aceitável em tempo de guerra; mas a proporção de 3 ou 4 perdas russas para 1 ucraniana parece confirmada pelo site ORYX. Ao contrário do Kremlin, os ucranianos são mestres da informação e contrainformação. O diretor da GBU, general Kyril Budanov divulgou recentemente um vídeo de sua autoria com 30’ de silêncio, uma lição magistral contra o palavreado generalizado dos media convencionais e das redes.
  4. c) Alguns oficiais generais dos EUA com experiência europeia, como Hertling e Petraeus, e fontes oficiais dos EUA sobre apoio logístico e material são indispensáveis quanto a dados e análises; os serviços de informação britânicos sabem mais sobre a Rússia do que o resto da Europa, desde a guerra contra Napoleão; algumas informações da Polónia e países bálticos e holandeses da ORYX são interessantes.

A linha principal da contraofensiva ucraniana será definida quando tiver de ser. Não vale a pena perder tempo com o barulho da propaganda do Kremlin e dos “perfeitos idiotas ocidentais”. Os ucranianos estão em guerra há 9 anos. Após derrotarem o exército profissional de Putin em 2022, irão tentar desfazer-lhe o exército amador em 2023 na hora e local possíveis.

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2 Responses to Crónica da Invasão da Ucrânia, à distância . A terceira contra-ofensiva ucraniana

  1. Edite diz:

    Mais uma excelente Crónica!
    Parabéns ao Autor e ao Jornal de Oleiros!

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